07 abril, 2007

O Parque e a Estátua



Mais uma visita ao parque do granja, cuja beleza não me cansa.
Bom local para ficarmos deitados na relva a ler um bom livro, dar uns mergulhos na humilde piscina, rir com os amigos, brincar com as crianças, etc...

No caminho de regresso à cidade acontece o indesejável. Furo num dos pneus. Aproveito para tirar umas fotos à estátua mais bonita e simbólica que conheço do Agostinho Neto.
A estátua mostra um Agostinho Neto sentado no chão, e debroçado sobre o seu caderno vai escrevendo as suas notas ou poemas, carregando às costas uma mochila e a espingarda AK.
Fica a questão... Qual a mais eficaz e justa das armas? A AK ou a caneta?








05 abril, 2007

um cheirinho... Que saudades da Vô Zita


Ao tentar adormecer ao som dos tiros ela meditava, e pensava que tinha passado mais um dia. Mais um dia com o constrangimento de regressar a casa e nunca saber se iria encontrar todos vivos e de saúde, e saber que cada encontro, cada olhar, cada beijo poderia ser o ultimo.
Ter que deitar-se com a angustia da guerra continuar pelo amanhecer, e a esperança da guerra acabar, tornava a sua cama cada vez mais pequena.
Por vezes a avô Zita aproximava-se lentamente, sempre denunciada pela sua enorme sombra na parede, tremida apenas pelas inconstâncias da chama da vela, e por aquele som característico de arrastar chinelos, sentava-se à beira do colchão, com as suas mãos duras e rugosas acariciava-lhe a cabeça, e como despedida dava-lhe um beijo na testa dizendo, Dorme bem minha filha. Ao fazer isto, a avô levava consigo a angustia, e a cama ficava mais confortável, mais espaçosa.
De seguida, Belita fechava os olhos e voltava a ouvir os toques dos chinelos, agora a afastarem-se, como uma musica e dança que estão terminando, o som baixando de volume a medida que dançarinos saem de palco. Ouvia agora o bater da porta. Vozita era a chefe da família, e a única que recusava-se peremptoriamente a dormir na casa dos vizinhos, só por oferecer mais segurança.
Dizia, Se tiver que morrer nesta guerra, vai ser na minha casa, então, todas as noites ela regressava sozinha ao seu palácio, sentava o seu enorme corpo no velho cadeirão, acendia o seu cigarro naquele silêncio e escuridão, onde só se via a luz vermelha do cigarro entre os dedos mulatos e grossos com unhas pintadas num vermelho vivo, como o seu sangue.
As lágrimas vertiam timidamente pelos olhos de Belita, cada vez que a Vozita saía sozinha de noite, pensava que podia ser a ultima vez que a tinha visto, mas Belita encorajava-se sempre quando pensava muito na avô, era como se fosse um imponente imbundeiro bem enraizado nesta terra, que teimava em ficar, quando todos fugiam. Teimava em viver a sua vida calmamente dentro daquela incompressível normalidade.
Lembrava-se agora do ritual de refugiarem-se nos bunkers improvisados em alguns quintais dos vizinhos, de passar pela avô naquele largo junto à casa, e vê-la sozinha, curvada com aquele rabo enorme para cima, e cabeça coberta com o lenço para baixo, arrancando vigorosamente à mão o impertinente capim, cuidando assim das suas culturas de abóbora, enquanto aqueles impertinentes camaradas do MPLA, passavam lá em cima nos seus mig´s, bombardeando indiscriminadamente a cidade, semeando a dor e destruição... diferentes culturas, pensava Belita, oxalá a avô arrancasse também desta terra aqueles impertinentes camaradas, aqueles e os da UNITA. Agora, depois de encorajada, mas ainda com resíduos das lágrimas, Belita sorria, estava a lembrar-se dos soldados da UNITA prenderem a Vozita.
Ò mãezinha já viu o que está a fazer? Tem a bandeira com a cabeça do mais velho (Savimbi) voltada para baixo!?!? Vamos ter que a prender.
Num bairro controlado pela UNITA, era a única família que preferia o MPLA, talvez também por serem todas mulatas e terem sofrido algumas perseguições da UNITA por não serem negras, valeu-lhes sempre terem uma familiar casada com um importante membro da UNITA, que fez com que tivessem escapado a muitas perseguições, e neste caso, valeu a libertação da Vozita.
A Vozita jurou ate aos seus últimos dias, que estava distraída quando içou a bandeira, mas dizia-o sempre rindo às gargalhadas e abanando a cabeça.

29 março, 2007

O Regresso

Regresso

Estou só,
entre o fim e o inicio,
sinto agora as mãos na face
Frias e secas,
Que lentamente vão abrindo como portões antigos,
permitindo que a claridade entre e ocupe o seu lugar,
neste reino abandonado.

28 março, 2007

Canis Lupos Signatos

Vontades de Lobo

É noite
Lá fora, os cães ladram
Cá dentro, vou sonhando
uivar nessas matas
debaixo da luz lunar
e matar a sede no jardim dos ventos

23 março, 2007

Maus inquilinos



Salmonella Typhi é o meu recente inquilino bacilo, que só me tem dado dores de cabeça, e também como já ando cansado, recorri à Cripofloxacina para proceder ao processo de acção de despejo deste caloteiro.


Para grandes males, grandes remédios.

15 março, 2007

Eleitores Fantasma

Em leitura de um jornal semanário, fiquei surpreendido com a noticia:
Há 800 mil portugueses a mais registados como eleitores.
“um em cada 11 eleitores não existe” segundo várias fontes oficiais e de um estudo de dois estudantes do mestrado de Politica comparada do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
Consequências:

Bom... no caso da Madeira, registam-se que 20% dos inscritos não vivem no arquipélago ou talvez tenham morrido, ninguém sabe ao certo, este facto permitiu a essa região autónoma eleger 6 deputados em vez de 5.

Como já se sabe, os salários dos vereadores e presidentes de juntas de freguesias é depende do numero de eleitores, portanto esta situação é favorável a muitas autarquias que não actualizam os seus cadernos eleitorais.

Afinal a abstenção não é o monstro que políticos e analistas pintam, quando falarem de abstenção podemos sempre tirar cerca de 9% aos números apresentados, e então estaremos mais próximos da realidade.

E no caso do referendo do aborto, os 54% de abstenção, afinal na realidade correspondem a menos de 50%, o que tornaria a lei vinculativa e teria ficado aprovada directamente nas urnas, se o recenseamento estivesse corrigido.

11 março, 2007

Face Negra


Conheci o Peter no cyber café do Huambo. Para terem uma pequena ideia, estive das 9h00 até às 16h00 no cyber para conseguir enviar 4 emails. Depois mais uma queda da ligação e um fuck off desesperante do Peter, decidi meter conversa com ele. Começamos precisamente por falar sobre a ligação da Internet. O desespero era o mesmo, tal como eu, o Peter queria enviar os emails com os relatórios mensais para o chefe.
O Peter é rapaz para os seus 50 anos, com aspecto um pouco british, e trabalha numa ONG aqui no Huambo, e estava a queixar-se que os chefes dele não entendem que os atrasos de envio de alguns documentos por net. Conversa puxa conversa, fomos parar ao passado do Peter. Ele já conhece Angola desde há 20 anos.
Com um olhar distante e de testa franzida, contou-me que fora mercenário sul africano que combateu ao lado da UNITA, contra as forças do MPLA. Embora ele me tenha contado algumas aventuras durante a sua estada de várias semanas nas matas do norte, que demonstram os limites do ser humano, reparei que começara a desviar o olhar e a ficar um pouco perturbado, e então decidi que devia parar com as perguntas sobre esse passado. E que a certa altura, desertou porque estava farto dos crimes, (tal como lhes chamou) refugiando-se no Zimbabué durante uns anos, voltando depois ao seu país, Africa do Sul. Mas ficou desiludido com as politicas racistas do seu país, diz que não se sente um sul africano, não se revê no seu país, e voltou agora a Angola, talvez com algum sentimento de divida, digo eu.
Fiquei encantado com a mudança... de mercenário a técnico de uma ONG estando a colaborar na produção de próteses que tem como destino muita gente que perderam membros por minas provavelmente fornecidas por ele, ou por seus colegas. Foi por esse encantamento que decidi partilhar convosco esta curta história, e lembrar que... toda a alma tem uma face negra.

04 março, 2007

Fotos no Huambo

Cemitério dos comboios
Camimhos Ferro de Benguela


Vestígios de urbanismo e arquitecturas - anos 60




03 março, 2007

Prima Mena - as palavras que estavam em falta

Quero falar-vos da minha prima Filomena.
Sempre fui o caçula, o mais novo da familía. O meu Pai diz que eu vim por engando, já não estavam a contar com o terceiro. Eu digo que não deve ter havido melhor engano na vida dele do que eu. Por isso, com uma boa diferença de idades, eu, o mais novo de todos os primos, era aquele que ficava com os "velhos" quando todos saiam juntos.
Das minhas primas, nas 3 filhas da irmã de meu Pai, houve sempre uma que tratava-me de forma diferente, a mais nova, chamamos-lhe: Mena. Cada vez que a via à minha frente, já sabia... lá vinha um insulto, beliscão, uns cascudos, ou puxão de orelhas, enfim os castigos eram variados.
Ainda que eu não gostasse desses castigos, não deixava de gostar dela, não por ser masoquista, mas sim por entender que era a sua forma tão própria de mostrar afecto.
Com o amor que tenho por TODOS os meus primos, mesmo aqueles com quem tenho tido pouco contacto, sempre senti a diferença da Mena, sem dúvida ela é especial.
Apesar do teu frágil coração ter-te traído, e mesmo depois do transplante, continuas a ser aquela presença indispensável em qualquer família.
Agora mais do que nunca, Admiro-te, não só pela força, carácter, coragem e vontade de viver, mas também por essa tua condição de estar para os outros de forma diferente. Teimosamente diferente.
Tomo a ousadia de falar pelo resto da família, mas é justo que fique aqui registado dizer-te que és um exemplo para todos nós, e isto é tudo menos uma palmadinha nas costas, porque embora com menos qualidade de vida, continuas a ser o poço de energia e vitalidade invejável, caso contrário não estarias entre nós. É nesses momentos mais complicados da vida, que nos revelamos, que somos postos à prova, e tu sem dúvida que no meio desse sofrimento, revelaste-te um ser humano maravilhoso.
Parabéns pelo teu percurso, resistência e firmeza, e obrigado por ficares connosco. Nunca te disse, mas por muitos momentos tive medo que fosses embora.
Perdoa a minha ausência nos momentos difíceis, mas embora esteja longe conta sempre com o meu afecto, porque tal como tu, vai sendo desta forma diferente que eu manifesto esse meu sentimento.
Beijos deste teu primo africano, Caramela. ;)

01 março, 2007

Domingo Diferente

Adventistas do 7º Dia
Pena não ter som... pois estavam a cantar muito bem
Parque do Granja - A ser explorado pela empresa nacional
dos petróleos como não poderia deixar de ser. Entrada - 4Euros