29 março, 2007

O Regresso

Regresso

Estou só,
entre o fim e o inicio,
sinto agora as mãos na face
Frias e secas,
Que lentamente vão abrindo como portões antigos,
permitindo que a claridade entre e ocupe o seu lugar,
neste reino abandonado.

28 março, 2007

Canis Lupos Signatos

Vontades de Lobo

É noite
Lá fora, os cães ladram
Cá dentro, vou sonhando
uivar nessas matas
debaixo da luz lunar
e matar a sede no jardim dos ventos

23 março, 2007

Maus inquilinos



Salmonella Typhi é o meu recente inquilino bacilo, que só me tem dado dores de cabeça, e também como já ando cansado, recorri à Cripofloxacina para proceder ao processo de acção de despejo deste caloteiro.


Para grandes males, grandes remédios.

15 março, 2007

Eleitores Fantasma

Em leitura de um jornal semanário, fiquei surpreendido com a noticia:
Há 800 mil portugueses a mais registados como eleitores.
“um em cada 11 eleitores não existe” segundo várias fontes oficiais e de um estudo de dois estudantes do mestrado de Politica comparada do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
Consequências:

Bom... no caso da Madeira, registam-se que 20% dos inscritos não vivem no arquipélago ou talvez tenham morrido, ninguém sabe ao certo, este facto permitiu a essa região autónoma eleger 6 deputados em vez de 5.

Como já se sabe, os salários dos vereadores e presidentes de juntas de freguesias é depende do numero de eleitores, portanto esta situação é favorável a muitas autarquias que não actualizam os seus cadernos eleitorais.

Afinal a abstenção não é o monstro que políticos e analistas pintam, quando falarem de abstenção podemos sempre tirar cerca de 9% aos números apresentados, e então estaremos mais próximos da realidade.

E no caso do referendo do aborto, os 54% de abstenção, afinal na realidade correspondem a menos de 50%, o que tornaria a lei vinculativa e teria ficado aprovada directamente nas urnas, se o recenseamento estivesse corrigido.

11 março, 2007

Face Negra


Conheci o Peter no cyber café do Huambo. Para terem uma pequena ideia, estive das 9h00 até às 16h00 no cyber para conseguir enviar 4 emails. Depois mais uma queda da ligação e um fuck off desesperante do Peter, decidi meter conversa com ele. Começamos precisamente por falar sobre a ligação da Internet. O desespero era o mesmo, tal como eu, o Peter queria enviar os emails com os relatórios mensais para o chefe.
O Peter é rapaz para os seus 50 anos, com aspecto um pouco british, e trabalha numa ONG aqui no Huambo, e estava a queixar-se que os chefes dele não entendem que os atrasos de envio de alguns documentos por net. Conversa puxa conversa, fomos parar ao passado do Peter. Ele já conhece Angola desde há 20 anos.
Com um olhar distante e de testa franzida, contou-me que fora mercenário sul africano que combateu ao lado da UNITA, contra as forças do MPLA. Embora ele me tenha contado algumas aventuras durante a sua estada de várias semanas nas matas do norte, que demonstram os limites do ser humano, reparei que começara a desviar o olhar e a ficar um pouco perturbado, e então decidi que devia parar com as perguntas sobre esse passado. E que a certa altura, desertou porque estava farto dos crimes, (tal como lhes chamou) refugiando-se no Zimbabué durante uns anos, voltando depois ao seu país, Africa do Sul. Mas ficou desiludido com as politicas racistas do seu país, diz que não se sente um sul africano, não se revê no seu país, e voltou agora a Angola, talvez com algum sentimento de divida, digo eu.
Fiquei encantado com a mudança... de mercenário a técnico de uma ONG estando a colaborar na produção de próteses que tem como destino muita gente que perderam membros por minas provavelmente fornecidas por ele, ou por seus colegas. Foi por esse encantamento que decidi partilhar convosco esta curta história, e lembrar que... toda a alma tem uma face negra.

04 março, 2007

Fotos no Huambo

Cemitério dos comboios
Camimhos Ferro de Benguela


Vestígios de urbanismo e arquitecturas - anos 60




03 março, 2007

Prima Mena - as palavras que estavam em falta

Quero falar-vos da minha prima Filomena.
Sempre fui o caçula, o mais novo da familía. O meu Pai diz que eu vim por engando, já não estavam a contar com o terceiro. Eu digo que não deve ter havido melhor engano na vida dele do que eu. Por isso, com uma boa diferença de idades, eu, o mais novo de todos os primos, era aquele que ficava com os "velhos" quando todos saiam juntos.
Das minhas primas, nas 3 filhas da irmã de meu Pai, houve sempre uma que tratava-me de forma diferente, a mais nova, chamamos-lhe: Mena. Cada vez que a via à minha frente, já sabia... lá vinha um insulto, beliscão, uns cascudos, ou puxão de orelhas, enfim os castigos eram variados.
Ainda que eu não gostasse desses castigos, não deixava de gostar dela, não por ser masoquista, mas sim por entender que era a sua forma tão própria de mostrar afecto.
Com o amor que tenho por TODOS os meus primos, mesmo aqueles com quem tenho tido pouco contacto, sempre senti a diferença da Mena, sem dúvida ela é especial.
Apesar do teu frágil coração ter-te traído, e mesmo depois do transplante, continuas a ser aquela presença indispensável em qualquer família.
Agora mais do que nunca, Admiro-te, não só pela força, carácter, coragem e vontade de viver, mas também por essa tua condição de estar para os outros de forma diferente. Teimosamente diferente.
Tomo a ousadia de falar pelo resto da família, mas é justo que fique aqui registado dizer-te que és um exemplo para todos nós, e isto é tudo menos uma palmadinha nas costas, porque embora com menos qualidade de vida, continuas a ser o poço de energia e vitalidade invejável, caso contrário não estarias entre nós. É nesses momentos mais complicados da vida, que nos revelamos, que somos postos à prova, e tu sem dúvida que no meio desse sofrimento, revelaste-te um ser humano maravilhoso.
Parabéns pelo teu percurso, resistência e firmeza, e obrigado por ficares connosco. Nunca te disse, mas por muitos momentos tive medo que fosses embora.
Perdoa a minha ausência nos momentos difíceis, mas embora esteja longe conta sempre com o meu afecto, porque tal como tu, vai sendo desta forma diferente que eu manifesto esse meu sentimento.
Beijos deste teu primo africano, Caramela. ;)

01 março, 2007

Domingo Diferente

Adventistas do 7º Dia
Pena não ter som... pois estavam a cantar muito bem
Parque do Granja - A ser explorado pela empresa nacional
dos petróleos como não poderia deixar de ser. Entrada - 4Euros













22 fevereiro, 2007

... Branco-Negro e Negro-Branco


No caso das ex-colónias Portuguesas em Africa, poderão considerarem-se que 3 décadas depois das independências, não sejam suficientes para resolver os traumas e outros problemas originados por mais de 500 anos de opressão, e exploração colonial.
30 anos após a independência destes países, verifica-se que continua a opressão e exploração e que apenas ganharam outras formas e outros protagonistas de cor de pele diferente.
Esta situação associada a entrada descontrolada de investidores, e quadros técnicos da cor dos ex-colonos, e perante o desleixo deliberado ou não dos governantes destes países africanos, vai dando origem a uma onda generalizada de racismo.

Tive a oportunidade de ler num jornal semanário, o seguinte:
“...A tensão sobe e nem a África Ocidental é poupada. De Abidjan a Lomé, jovens africanos exigem uma «segunda descolonização» e acusam os franceses de «neocolonialismo». Na África lusófona, também se discute o lugar dos brancos.”
Relativamente à ultima frase, tive duas experiências nas ultimas semanas que a tornam mais consistente.

Há uns dias, em conversa de restaurante, um conhecido meu que é mulato e angolano estava a dizer o seguinte:
“Estamos a ser novamente colonizados... pelos Chineses, Portugueses, Brasileiros...”
Fui completamente surpreendido pela expressão de revolta que vi no seu rosto quando proferiu a frase.
Outra experiência, foi uma conversa que tive com o fiscal que é angolano. Dizia-lhe eu a certa altura, que muitos portugueses estão a vir para cá, porque Angola tem falta de quadros técnicos, resultado de 1 guerra de 30 anos. Diz-me ele: não engenheiro, está enganado. Aqui o angolano continua a ser explorado, pagam-lhe menos do que a um português, para as mesmas funções.”

Agora não interessa se o fiscal tinha razão ou não. O que interessa retirar daqui, é o sentimento das marcas do colonialismo que ainda estão bem presentes neste continente, revestidas por uma capa de racismo que se vai tecendo sem que muitos dêem por isso. É importante que os governos Africanos tenham mais atenção e cuidado com esta questão.
Digo isto porque por exemplo, o governo sul africano impôs por lei, que haja acesso de empresários negros a uma certa percentagem dos capitais sociais das empresas. Só por serem negros, não interessando se são ou não bons empresários, e isto também está a ser aplicado na administração pública e forças de segurança.
Para uns poderá aparentar ser uma boa medida, mas no entanto, criam-se tensões junto dos brancos sul africanos. Pergunta simples: Leis que diferenciem o individuo pela cor da pele, não serão Apartheids? Não acho que Agostinho Neto, Amílcar Cabral ou Nelson Mandela, que lutaram pelos ideais que também defendo, estivessem de acordo com este tipo de medidas.
Tal como o que se passa, no médio oriente, conflito Israel-Palestina... esta questão também vai passando ao lado da Europa, cada vez mais fechada sobre si mesma.

19 fevereiro, 2007

Fotografia em palavras

O dia está lindo, o sol brilha, o céu apresenta-se num azul vivo e com grandes flocos de algodão branco a flutuar.
Pela periferia da cidade, encontro-me a conduzir descontraidamente a pickup numa estrada de terra batida e vermelha como sempre, limitada por bonitas arvores e pessoas que passam de ambos os lados da estrada. Pessoas que na sua maioria são africanos rurais, daqueles que têm aquele encanto natural.
É domingo, e aproveito para ver com melhor detalhe aquilo que me escapa nos outros dias.
A determinado momento, cruzo-me com um “mais velho” dos seus 70anos com o seu corpo magro e seco enfiado num fato azul, camisa branca e gravata da cor do fato, andando a pé, ostentando uns velhos sapatos pretos engraxados. Vai orgulhosamente caminhando, e pegando de forma elegante no guiador da sua motorizada (tipo zundap) que apresenta-se nos mesmos modos do seu dono. Com os cromados do guiador e rodas a brilhar, bem como o vermelho do deposito. Atrás dele vem uma jovem, também ela a preceito, com um bonito vestido típico africano. Ainda consigo visualizar o padrão aos losangos pretos e castanhos desse vestido. Pode ficar a questão, filha ou namorada, mas não é o que interessa.
O mais importante é esta imagem ter ficado retida na minha mente, e cuja beleza queria partilhar convosco.
Gosto de fotografia, mas ainda não ganhei ousadia para fotografar pessoas. Até lá, vou tentando usar as palavras.